Em seus inúmeros títulos lançados, Mario Sergio Cortella consegue nos cativar com a profundidade de suas palavras, ao mesmo tempo que consegue uma simplicidade em sua fala que muitos de nós nos sentimos verdadeiros ignorantes. Isso porque ele fala com tanta propriedade que dificilmente alguém teria como se opor. Tal condição se consolida por suas décadas de estudos, aulas, livros, palestras, entrevistas e tantas outras atividades que apenas reforçam sua sabedoria.
O livro “Pensar Bem Nos Faz Bem! Vol. 2”, parte integrante de uma série composta por quatro livros. Este segundo aborda família, carreira, convivência e ética, temas discutidos aos quatro cantos e tão relevantes em nossa sociedade.
Os textos do livro foram compilados e adaptados a partir dos comentários do autor na coluna Academia CBN, apresentados em rede nacional, de segunda à sexta-feira, às 6h32, de maio de 2012 a abril de 2013. As reflexões não seguem necessariamente a ordem em que foram ao ar pela Rádio CBN e, embora organizadas pelos temas Filosofia, Religião, Ciência e Educação, não foram agrupadas em bloco em torno de cada um destes, de modo a preservar essa característica que a coluna tem no cotidiano.
Alguns trechos interessantes da obra:
O lugar do novo, a ideia do inédito, aquilo que está grávido, e a palavra é essa mesmo: grávido, impregnado. Um italiano ao ler esta palavra em português, impregnado, leria emprenhado, isto é, engravidado. Aquilo que é inédito está grávido do novo, aquilo que pode trazer para nós uma outra possibilidade, uma outra condição, aquilo que ainda não é. Certa forma de ânimo, de alma, de ficar animado na suposição, que amiúde é ativa, isto é, foge da mera espera de construir aquilo que ainda não é. De maneira geral, temos uma disponibilidade muito grande frente à ideia do novo, de estabelecer propósitos, de colocar metas.
Em vários momentos, nossa sociedade caminha em direção ao egoísmo mental. Isto é, aquele que algo possui, seja intelectualmente, seja como propriedade, guarda para ele, não quer passar adiante. O que é um sinal de tolice. Afinal de contas, uma das regras fundamentais na história da humanidade foi a cooperação. Nós estruturamos, nos últimos 400 anos, uma sociedade com uma ideologia extremamente competitiva. Não que a competitividade não deva ter o seu lugar, mas ela não pode se sobrepor à colaboração como a principal maneira de sobrevivência da humanidade.
Ambição é uma palavra que, em vários momentos, é colocada como sendo um vício. Costuma-se até confundir a pessoa ambiciosa com aquela que é gananciosa. Ou seja, a que quer tudo para ela, a qualquer custo. Uma pessoa caracterizada, até do ponto de vista psicológico, pelo egoísmo. É muito importante que se tenha ambição na vida. Mas entendida como uma virtude e não como um vício. A ambição de querer saber mais, de conhecer mais, de querer uma carreira mais estruturada, uma formação mais completa, uma condição material mais extensa. Isso é ambição, que leva ao conhecimento, à capacidade de se fazer elevar as coisas que se tem. Nesse sentido, a ambição se diferencia da ganância, que é querer só para si, a qualquer custo. E é um custo que jamais deve ser pago, porque é eticamente apodrecido. A ambição movimenta a capacidade de buscar mais e melhor. É preciso fazer da ambição um caminho virtuoso.
A quem pertence a coisa pública? Quem é o proprietário de algo que é público, que, a princípio, seria de todos e todas. É claro que o proprietário daquilo que é de todos e todas são todos e todas. Embora pareça óbvio, não é incomum no nosso país – mas não para sempre – que se imagine que a coisa pública, a res publica, como diriam os latinos, não tenha dono. Isso não é verdade. A coisa pública tem de ser cuidada por todas as pessoas, de todos os modos, o tempo todo. Isso significa que a coisa pública não é a coisa sem proprietário. A coisa pública é aquela que não tem um exclusivo proprietário, que não tem um único alguém que manda, comanda ou que precisa zelar, cuidar, tomar conta.
Impeto é a força relacionada à atitude, à tomada de decisão, o que impulsiona e coloca no caminho de algo, seja o momento de iniciar um curso, seja a necessidade de desenvolver alguma competência, ou até tirar alguma incompetência que se tenha no trabalho, na vida, na escola. Isso tudo exige decisão. Quando é preciso decidir, além da cautela que imobiliza, há outro perigo, que é o ímpeto inconsequente, isto é, ir sem refletir, sem meditar.
Uma das coisas mais importantes na formação de uma personalidade, de um pesquisador, de um profissional, de uma criança e de um jovem, é que ele tenha esse senso de dever e o senso de urgência. Não se pode, evidentemente, ficar fazendo apenas aquilo que é urgente, também é necessário dedicar-se ao importante. Quando cuidamos demais do urgente, o importante fica de lado.
Arrogância é o orgulho desviado. Algumas vezes se confunde arrogância com orgulho. Uma pessoa orgulhosa, se ela é inteligentemente orgulhosa, não é arrogante. Orgulho é a satisfação de fazer algo, orgulho de alguém, de uma obra, do resultado obtido, da família que se constrói, da casa que se tem, de um sucesso. Isso é diferente de arrogância. Porque arrogância é a postura de alguém que entende que aquilo que fez ou aquilo que tem é superior a qualquer outra coisa. Sentir orgulho de ter conseguido algo é absolutamente diverso de sentir-se arrogante, isto é, arrogar-se, colocar-se numa posição superior.
Mario Sergio Cortella nasceu em Londrina/PR em 5 de março de 1954. É filósofo, escritor, educador, palestrante, doutor em educação e professor universitário brasileiro. É autor de vários livros, relacionados com filosofia, em que analisa a vida profissional na contemporaneidade. Cortella é considerado por muitos como um dos maiores pensadores brasileiros da atualidade. Reconhecido por sua habilidade de traduzir complexas ideias filosóficas em exemplos simples, Cortella é constantemente chamado a mídia para dialogar sobre diversos assuntos, principalmente sobre filosofia e educação. Professor convidado da Fundação Dom Cabral (desde 1997) e do GVpec da FGV-SP (entre 1997 e 2009), foi Secretário Municipal de Educação de São Paulo (1991-1992). É comentarista e colunista em programas de rádio e televisão, além de ter presença constante nas mídias digitais, e também autor, até 2020, de 45 livros publicados no Brasil e exterior.