A quem diga que a pandemia passou. Outros dizem que estamos no começo do fim. Existem também aqueles que sequer reconhecem que houve uma pandemia, chegando a afirmar que doenças vem e vão e que, por isso, a covid-19 seria apenas mais uma entre as tantas que já existem e que sempre existirão.
Independente do que você acredita ou não, é inegável que a existência do coronavírus tenha causado um impacto de proporções devastadoras na humanidade. Me refiro a tantas vidas ceifadas, tantos lares destruídos, famílias dilaceradas com a perda de seus entes queridos.
Lançado em 2020, o livro “Notas sobre a pandemia: E breves lições para o mundo pós-coronavírus (artigos e entrevistas)” de Yuval Noah Harari descreve sob o olhar crítico do autor conhecido por outras obras emblemáticas como “Sapiens” e “Homo Deus“, as mazelas, impactos e consequências advindos da covid-19. Yuval Harari é claro, objetivo e direto ao ponto quando o assunto é tentar esclarecer este assunto que acabou por se tornar polêmico nas rodinhas de amigos, família, jornais, notícias… Tal discussão é extremamente necessária , ainda mais se levarmos em conta o excesso de fake news propagadas pelas redes ultimamente sobre o tema. Então acredite, vale a pena conferir!
Publicada no Brasil pela Editora Companhia das Letras, a obra é um compilado de entrevistas e artigos. Logo, não se trata de uma apresentação de forma linear e direcionada sobre a temática. Exatamente por isso, certos pontos podem ser identificados como recorrentes, fortalecendo inclusive os pontos comuns e de convicção forte do autor, marcados pelo pensamento coerente e bastante conciso, marcas registradas de Yuval Harari.
A sinopse oficial destaca:
Nesta coletânea inédita de artigos e entrevistas, Harari debate o impacto e as consequências da pandemia de covid-19.
O historiador israelense Yuval Noah Harari examina os dilemas da encruzilhada histórica provocada pela pandemia do novo coronavírus nos artigos e entrevistas reunidos nesta coletânea inédita. Publicados originalmente em veículos como a revista Time e os jornais Financial Times e The Guardian, eles exploram temas como a disputa ideológica entre isolacionismo nacionalista e cooperação global, o risco da ascensão de estados totalitários na esteira das novas tecnologias de monitoramento em massa e os possíveis impactos do vírus na concepção contemporânea da morte.
Harari desenvolve seus argumentos com a clareza de visão e de estilo que o consagrou, entrelaçando os caminhos e descaminhos da humanidade entre passado, presente e futuro. A boa notícia, ele ressalta, é que a maior parte do planeta concorda em concentrar os esforços nos avanços científicos em busca da cura e de uma vacina para o covid-19 – porém isso acontecerá apenas se a cooperação entre as nações for a prioridade dos líderes atuais.
Alguns trechos que merecem destaque:
“Ao longo do último século, cientistas, médicos e enfermeiros ao redor do mundo compartilharam informações e juntos conseguiram compreender tanto o mecanismo por trás das epidemias quanto os modos de combatê-las. A teoria da evolução explicou como e por que novas doenças deflagram e velhas doenças se tornam mais virulentas. Os estudos genéticos permitiram que os cientistas espionassem os manuais de instrução dos próprios patógenos. Enquanto os medievos nunca puderam descobrir a causa da peste negra, os cientistas levaram apenas duas semanas para identificar o novo coronavírus, sequenciar seu genoma e desenvolver um teste confiável para detectar pessoas infectadas.”
“A história indica que a proteção real vem da troca de informação científica confiável e da solidariedade global. Quando um país é atacado por uma determinada epidemia, deve estar disposto a compartilhar honestamente as informações sobre o surto, sem medo de uma catástrofe econômica, ao passo que os outros países devem ser capazes de confiar naquela informação, dispondo-se a estender uma mão amiga em vez de deixar a vítima no ostracismo. Hoje, a China pode ensinar uma porção de lições importantes sobre o coronavírus para o mundo inteiro, mas isso demanda um alto nível de confiança e cooperação internacionais. A cooperação internacional é também necessária para medidas eficazes de quarentena. A quarentena e o toque de recolher são essenciais para interromper a propagação da epidemia. Mas quando os países não confiam uns nos outros e cada nação sente que está por conta própria, os governos hesitam em adotar medidas tão drásticas. Se você descobrisse cem casos de coronavírus em seu país, você isolaria imediatamente cidades e regiões inteiras? Em boa medida, isso depende do que você espera dos outros países. Paralisar cidades pode levar ao colapso econômico. Se achar que os demais países virão em seu socorro, você se sentirá mais disposto a adotar essa medida drástica. Mas se achar que os outros países o abandonarão, provavelmente hesitará até que seja tarde demais.”
“Hoje, a humanidade enfrenta uma crise aguda não apenas por causa do coronavírus, mas também pela falta de confiança entre os seres humanos. Para derrotar uma epidemia, as pessoas precisam confiar nos especialistas, os cidadãos precisam confiar nos poderes públicos e os países precisam confiar uns nos outros. Nos últimos anos, políticos irresponsáveis solaparam deliberadamente a confiança na ciência, nas instituições e na cooperação internacional. Como resultado, enfrentamos a crise atual sem líderes que possam inspirar, organizar e financiar uma resposta global coordenada.”
“A atual crise pode, sim, tornar muitos indivíduos mais conscientes da natureza impermanente da vida e dos feitos humanos. No entanto, a civilização moderna como um todo provavelmente seguirá na direção oposta. Diante do lembrete de sua fragilidade, reagirá construindo defesas ainda mais fortes. Quando a crise acabar, não espero ver um crescimento significativo no orçamento dos departamentos de filosofia. Mas aposto que veremos um crescimento maciço das verbas direcionadas a faculdades de medicina e sistemas de saúde.”
“Os humanos são especialmente vulneráveis a epidemias, pois somos animais sociais. E é assim que epidemias se propagam. O que é capcioso nos vírus é que eles muitas vezes usam os melhores instintos da natureza humana contra nós mesmos. Exploram o fato não apenas de que gostamos de socializar, mas também o fato de que ajudamos uns aos outros. Quando alguém adoece, a coisa óbvia e natural a fazer, especialmente se se trata de um membro da família ou um amigo, é prestar auxílio, cuidar, dar apoio emocional, tocá-lo, abraçá-lo. E é exatamente assim que o vírus se propaga.”
Yuval Noah Harari nasceu em 1976, em Israel. É autor de Sapiens: Uma breve história da humanidade, best-seller internacional publicado em mais de 35 países, Homo Deus e 21 lições para o século 21. É ph.D. em história pela Universidade de Oxford e professor na Universidade Hebraica de Jerusalém.