O livro “Dúvidas Filosóficas” de Bertrand Russell é um livro bastante curto, podendo ser lido em poucos minutos. Nem por isso é raso ou leviano.
Dúvidas filosóficas nos revela os princípios norteadores do pensamento de Bertrand Russell, claramente um dos mais importantes e aclamados filósofos do século 20. O desenvolvimento do texto é bastante didático e fácil de ler, justamente por não se prende a tanta profundidade e conceitos, podendo ser apreciado por um público bastante diverso. É bastante esclarecedor e leitura recomendada para aqueles que querem compreender melhor o ato de filosofar.
Três trechos iniciais da obra dão um bom vislumbre do que virá a seguir:
Talvez fosse de se esperar que eu começasse pela definição de “filosofia”, mas, certo ou errado, não me proponho a tal. A definição de “filosofia” variará segundo a filosofia que adotarmos; para começar, diremos apenas que há certos problemas, julgados interessantes por certas pessoas, mas que não
pertencem, pelo menos até agora, a qualquer uma das ciências especiais. Esses problemas são de molde a levantar dúvidas a respeito do que comumente se entende por conhecimento; e se as dúvidas requerem resposta, esta virá unicamente por meio de um estudo especial, a que denominamos “filosofia.” Portanto, o primeiro passo para definir “filosofia” está na indicação de tais problemas e dúvidas – e será também o primeiro passo no verdadeiro estudo da filosofia. Entre os tradicionais problemas da filosofia, há alguns que não parecem merecer, em minha opinião, tratamento intelectual, por transcenderem nossa capacidade cognitiva; desses problemas não cuidarei. Existem outros, porém, para os quais, embora não seja possível encontrar-se solução definitiva neste momento, pode-se indicar o rumo para uma busca de solução, e o tipo de solução que, em tempo oportuno, venha a se revelar possível.A filosofia origina-se de uma tentativa obstinada de atingir o conhecimento real. Aquilo que passa por conhecimento, na vida comum, padece de três defeitos : é convencido, incerto e, em si mesmo, contraditório. O primeiro passo rumo à filosofia consiste em nos tornarmos conscientes de tais defeitos, não a fim de repousar, satisfeitos, no ceticismo indolente, mas para substituí-lo por uma aperfeiçoada espécie de conhecimento que será experimental, precisa e autoconsistente. Naturalmente, desejamos atribuir outra qualidade ao nosso conhecimento : a compreensão. Desejamos que a área de nosso conhecimento seja a mais ampla possível. Isto, no entanto, é mais da competência da ciência que da filosofia. Um homem não vem a ser necessariamente melhor filósofo graças ao conhecimento de maior número de fatos científicos; são os princípios e métodos, e as concepções gerais, que ele deva apreender da ciência, caso a filosofia seja matéria de seu interesse. A missão do filósofo é, a bem dizer, a segunda natureza do fato bruto. A ciência tenta agrupar fatos por meio de leis científicas; estas leis, mais que os fatos originais, são a matéria-prima da filosofia. A filosofia envolve uma crítica, do conhecimento científico, não de um ponto de vista em tudo diferente do da ciência, mas de um ponto de vista menos preocupado com detalhes e mais comprometido com a harmonia do corpo genérico das ciências especiais.
As ciências especiais desenvolveram-se pelo uso de noções derivadas do senso comum, tais como coisas e suas qualidades, espaço, tempo e causalidade. A própria ciência tem demonstrado que nenhuma dessas noções baseadas no senso comum presta-se completamente à explicação do mundo; nenhuma ciência tem atribuição de empreender a necessária reconstrução de fundamentos. Isto deve ser matéria da filosofia. Quero dizer, desde logo, que acredito ser este um empreendimento da maior importância. Acredito que os erros filosóficos nas crenças do bom senso não somente produzem confusão na ciência, como também prejudicam a ética e a política, em instituições sociais, e a conduta de todos na vida diária.
Bertrand Arthur William Russell (ou simplesmente Bertrand Russell como ficou mundialmente conhecido) nasceu em 1872, no auge do poderio econômico e político do Reino Unido. Por diversas ocasiões de vida, Russell se considerou um liberal, um socialista e um pacifista. Entretanto, ele próprio também admitiu que nunca foi nenhuma dessas coisas de forma mais aprofundada. Russell foi um grande popularizador da filosofia, sendo respeitado por inúmeras pessoas como um guru da vida racional e da criatividade. Várias de suas posturam em temas diversos foram consideradas controversas.
Foi matemático, lógico, filósofo, ensaísta, crítico social, historiador e ativista político britânico. Certamente podemos dizer que Russel foi um dos mais influentes do século XX nestas áreas. Recebeu o Nobel de Literatura de 1950, “em reconhecimento dos seus variados e significativos escritos, nos quais ele lutou por ideais humanitários e pela liberdade do pensamento”. Uma das características mais marcantes do pensamento de Russell era certamente o ceticismo. O primeiro “mandamento” do filósofo era: “Não tenha certeza absoluta”.
Ao longa de sua vida, Bertrand Russell elaborou algumas das mais influentes teses filosóficas do século XX, e, com a partir delas, ajudou a fundamentar a base a chamada Filosofia Analítica.
Russell morreu em 1970, vítima de uma gripe.