O Problema de Nascer

 The Trouble with Being Born (2020) on IMDb
O ser humano já tem, de forma intrínseca, a dádiva divina ou o dom de criarmos um ser, à sua imagem e semelhança. Os chamamos filhos. Os humanos já nascem com tal habilidade, por assim dizer. Mas, o desenvolvimento real das partes deste novo ser, a construção real dele, ocorre pela própria natureza. Podemos considerar que o homem não ‘interfere’ no processo. Talvez por isso que desde que a tecnologia chegou ao ponto de poder manipular elementos que pudessem imitar o homem, surgiu a cibernética, a robótica e outras áreas que, aliadas a medicina e demais áreas do conhecimento, concebem robôs, androides e autômatos que, em via de regra, tem como propósito e função, se tornarem criações unicamente humanas (sem uma intervenção da natureza ou mesmo divina). Tais áreas mexem com a imaginação de muita gente, que atribui tantas características a elas que, boa parte das vezes, são medos nem não justificados assim.

Em todo o caso, bonecos já existem a séculos e o que eles são, senão uma imitação da vida, seja como um brinquedo ou aparato de substituição? O que fica evidente é que tais criações surgem em um momento que o homem busca um objeto ou algo que possa suprir suas necessidades emocionais, operacionais, humanas, enfim. Se você assistiu a A.I – Inteligência Artificial, de Steven Spielberg, certamente entenderá do que estou falando. É a história de um Pinóquio moderno que, nem por isso, é desinteressante. Muito pelo contrário, ela cativa e nos faz refletir.

Extremamente provocador (e até chocante em alguns momentos), o drama de ficção científica “O Problema de Nascer” (The Trouble with Being Born, no original) trata exatamente disso, explorando o topos do humano artificial, aqui apresentado de forma inusitada com foco no nível emocional. Conforme a narrativa avança, a trama nos conduz a indagarmos se as pessoas estarão preparadas no futuro para possuir um robô humanoide que supra suas necessidades. O trailer pode ser visto aqui.

O enredo nos apresenta Elli (Lena Watson) uma criança de 10 anos que na verdade é um andróide, uma máquina, na forma de uma menina, assim como um robô sexual. Elli vive com Georg (Dominik Warta) , a quem ela chama de “Papa”. Ela o ama. No verão, eles nadam na piscina durante o dia e à noite ele a leva para a cama com ele. Georg criou Elli a partir de uma memória pessoal, para se fazer feliz. É, portanto o receptáculo de suas memórias. Memórias que não significa nada para ela e tudo para ele, já que, para Elli, é apenas a programação que ela segue. No entanto, durante uma certa noite, Elli sai rumo à floresta seguindo um eco que se desvanece.

O filme, lançado em 2020, tem uma pegada distópica e retrata “a história de uma máquina e os fantasmas que todos carregamos dentro de nós”. Um convite formalmente denso e provocativo para o reino da realidade virtual e psicológica.

Em sua estreia no 70º Festival Internacional de Cinema de Berlim, o filme gerou polêmica por retratar uma relação entre um homem e um menor, embora um androide, que também se assemelha a seu filho.

A diretora Sandra Wollner, que escreve o roteiro junto com Roderick Warich, se referiu ao filme como a “antítese de Pinóquio”. Wollner inicialmente pretendia escalar uma atriz de 20 anos para o papel da androide Elli, mas depois de editar alguns dos elementos mais explícitos do roteiro do filme, escolheu a atriz de 10 anos Lena Watson (um nome artístico, inspirado por Emma Watson) para o papel. As cenas em que o androide é mostrado nu foram realizadas usando imagens geradas por computador. Watson também usava uma máscara de silicone e uma peruca, que serviram para esconder sua identidade.

O longa é uma produção Áustria / Alemanha. O elenco traz Lena Watson, Dominik Warta, Ingrid Burkhard, Jana McKinnon e Simon Hatzl.